Rafael Grohmann recebe Prêmio Luiz Beltrão 2021

Coroando a participação do CPCT no 44º Congresso da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), o pesquisador Rafael Grohmann recebeu o Prêmio Luiz Beltrão de Ciências da Comunicação 2021.

Coordenador do Laboratório de Pesquisa DigiLabour, ele é professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).

Rafael Grohmann ainda lidera no Brasil o projeto Fairwork, promovido em âmbito mundial pela Universidade de Oxford.

O prêmio, concedido na categoria Liderança Emergente, é um reconhecimento no meio acadêmico a trabalhos de destaque desenvolvidos por pesquisadores, grupos de pesquisa e instituições.

Confira no vídeo como foi a cerimônia de premiação.

A seguir, reproduzimos o discurso de Rafael Grohmann:

O que é ser liderança emergente?
O que é ser liderança emergente em um país que corta 92% do seu orçamento para a ciência e tecnologia no CNPq?
O que é ser liderança emergente em um momento em que a avaliação dos programas de pós-graduação – que, convenhamos, estava muito longe do que esperávamos – está paralisada? O que é ser liderança emergente em um momento em que colegas e estudantes estão cansados, doentes, morrendo? Sob esse governo, com o país em recessão econômica e tudo mais?

Fato é que, vocês sabem bem, tem dias que é difícil seguir. Nos sentimos sem possibilidades de ação. E notas de repúdio pouco ou nada resolvem. A pergunta que se repete milhões de vezes, imortalizada por um amigo há muitos anos, é: o que fazer?

Sinceramente, não sei. Mas certamente tenho pistas do que não fazer. Dia a dia, presenciamos vaidades acadêmicas individuais acima do que necessita área, pessoas que confundem crítica – sempre bem vinda, especialmente quando é franca e aberta – com grosseria.

Pois bem, parafraseando Bourdieu, a pesquisa em comunicação é um esporte de combate. Isso se dá em vários níveis. Precisamos disputar os sentidos, ressignificá-los, encontrar brechas e fissuras em nossas investigações e vivências. Precisamos ir além da sobrevivência. Reconheço a importância dos que buscaram há algumas décadas o lugar de um especificamente comunicacional. Mas agora precisamos ir além. As outras áreas precisam nos ler e nos respeitar. A comunicação é um lugar de articulação e um comum epistemológico.

A comunicação é um esporte de combate. Mas não exatamente um combate entre nós, trabalhadores e trabalhadoras da ciência e da educação neste país. Sim. É mais comum que nos chamemos de intelectuais, artistas, gênios, olimpianos. E aí quando você fala “olha só que legal o que tal pessoa fez”, a outra pessoa responde “ah, eu fiz melhor, eu sou melhor”. Mas somos trabalhadoras e trabalhadores, sujeitos à mesma plataformização do trabalho que tende à generalização, aos mecanismos de financeirização da educação, à escassez de vagas, entre outros.

Por isso a necessidade de solidariedades emergentes. Não aquela falsa do Criança Esperança. Mas, como diz Jodi Dean, que nos enxerguemos menos como aliados e mais como camaradas. Isso inclusive entre trabalhadores de universidades públicas, confessionais e privadas. De pensar mais no que nos une. Jodi Dean diz que há quatro atributos de camaradas. Disciplina, felicidade, entusiasmo e coragem. Gostaria de agradecer a todo mundo com quem compartilhei disciplina, felicidade, entusiasmo e coragem ao longo dos tempos. Enquanto sujeitos sociais, somos ao mesmo tempo o resultado das pessoas com quem compartilhamos trajetória e nossas ações escrevendo e inscrevendo nossa própria história.

Iniciei minha jornada em Juiz de Fora, Minas Gerais. Agradeço ao meu eterno orientador Paulo Roberto Figueira Leal, pela humildade que sempre anda de mãos dados da sabedoria, por me mostrar que escrever e falar empolado ou difícil não era o melhor caminho, pelo diálogo afetivo. Ao Jessé Souza, meu primeiro orientador, pelo extremo oposto. Aos professores que marcaram a minha formação, especialmente Iluska Coutinho e Márcio Guerra.

Continuei a caminhada em São Paulo, onde fiquei por quase dez anos. Na Escola de Comunicações e Artes da USP, fui muito feliz, como mestrando, doutorando e professor substituto. Quando lá cheguei, fui logo recepcionado pela seguinte pergunta: “Você tem certeza de que quer mesmo seguir esse caminho, sabendo que é o mais difícil, e que esse tipo de pensamento não é dominante em nosso campo?”. Era Roseli Fígaro, minha orientadora, colega, camarada. Minha vida não seria nada sem ela e o Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho, a quem agradeço todo mundo que passou por lá, em especial minha amiga Cláudia Nonato.

Agradeço demais à professora Maria Aparecida Baccega, cuja voz ecoa na minha mente até hoje. Com ela e com Roseli, aprendi que franqueza, disciplina e afeto andam lado a lado. Fico muito feliz também pela partilha de trajetórias com queridos que foram meus professores e colegas de trabalho na USP, amigos Eneus Trindade e Maria Immacolata Vassallo de Lopes. O meu muito obrigado também aos grandes mestres com que me encontrei em outras instituições, Muniz Sodré e Ricardo Antunes

Agradeço também a todas as minhas turmas de graduação e pós-graduação, estudantes e professores, desde quando era professor horista na Universidade de Taubaté, a Unitau, meu primeiro emprego como docente há mais de dez anos. Vivemos fortes emoções no FIAM-FAAM – Centro Universitário, com a criação e coordenação de um mestrado profissional em jornalismo, e a edição da revista Parágrafo. Por lá, batalhamos muitas e boas sob a égide de um conglomerado educacional estadunidense, procurando brechas. Na Cásper Líbero, onde tive duas passagens, agradeço principalmente ao Liráucio Girardi Jr., ao Marcelo Santos, e ao José Eugenio Menezes, nas alegrias e dores, que também nos fortalecem.

Há pouco mais de dois anos, cheguei a Porto Alegre, e logo de cara uma pessoa me recebeu e me apresentou à cidade. Meu querido Alexandre Rocha da Silva, onde você estiver, tim tim, um grande abraço ao seu marido Daniel Abs, que nos acompanha nessa jornada.

Não poderia estar mais feliz neste momento na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em um programa de pós-graduação e em uma universidade que são referências. Agradeço demais a todo o programa de pós-graduação em ciências da comunicação, em especial a equipe do laboratório DigiLabour, e incansáveis colegas docentes Maria Clara Aquino, Ronaldo Henn, Adriana Amaral, Gustavo Fischer, Sonia Montaño, Tiago Lopes, Suzana Kilpp, Jiani Bonin, Efendy Maldonado, Ana Paula da Rosa, José Luiz Braga, Antonio Fausto Neto, Jairo Ferreira e Pedro Gilberto Gomes.

Agradeço ao Intercom, que me recebeu graduando até a vice coordenação de GP, à Compós, à SBPJor e outras entidades da área. E a todo mundo com quem brindamos festas de congressos e karaokês.

E afinal, para que e para quem fazemos pesquisa? Agradeço a todas trabalhadoras e trabalhadores com quem convivemos diariamente, em especial, Movimento dos Trabalhadores sem Teto, Entregadores Antifascistas e Señoritas Courier.

Dedico este prêmio ao meu amor, Marcelo, e aos meus pais, por tudo, um aprendizado diário, também nas alegrias e dores.

Por fim, não desanimemos. Há espaços e brechas que não recaem nem em uma ingenuidade Ursinhos Carinhosos nem em um Grande Hotel Abismo. Que tenhamos ousadia para caminhar e também aprender com o passado, sem medo tanto da teoria quanto da pesquisa aplicada.

Como diz Álvaro Vieira Pinto, “a periculosidade da ciência é inerente à natureza. Por definição, não pode haver ciência inocente, inofensiva, porque só seria tal aquela que não servisse para nada, o que seria a negação da sua essência. O conhecimento é sempre uma arma na luta contra forças adversas, físicas ou sociais”.

Sejamos perigosas! Um brinde!

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